Há uns meses, uma cliente, sentiu-se mal à minha frente. Ela até se sentou na cadeira da operadora de caixa à minha frente que não estava ocupada.
Saí da minha caixa e fui lhe perguntar se ela sentia mal, vinham duas colegas a passar chame-ias aflita e preocupada. Ficaram logo com a senhora e pediram ajuda.
Conhecia a senhora dali, via-a muitas vezes com a filha, sempre simpática, educada e bem disposta.
Entretanto contactaram a família, chamaram o INEM, mas já não assisti ao resto porque a levaram para dentro.
Durante algum tempo não vi nem a senhora, nem a filha, as minhas colegas também não.
Mas não me esqueci da senhora e andava ansiosa por notícias.
Até que há dias a vi na minha fila, e logo me veio um sorriso por a ver bem, que ela retribuiu. Até lhe disse o quanto já me tinha lembrado dela. Lá me contou como foi, e nos agradeceu por termos sido atenciosas com ela. Da minha parte até nem fiz muito, porque estava a atender clientes, mas a senhora foi uma querida nas palavras que nos dedicou!
Confesso que foi uma grande satisfação a voltar a ver . Há tantos anos aqui, já há esta proximidade! É este lado humano da profissão que tanto gosto!
Podem achar, que por eu partilhar, em maioria, as situações mais caricatas ou menos boas que surgem com os clientes, sejam essas as que mais acontecem, mas não! Não é assim! Há muito mais situações positivas, normais, só que por serem tão comuns e vulgares, eu não lhes dedico tanto tempo antena!
Mas, quero dizer que sou muito grata, pela forma como a maioria dos clientes me tratam, pelo respeito, pela valorização, e pelas palavras amigas, que tantas vezes me salvam o dia.
Todos os dias quando saio do trabalho, tenho plena consciência que dei o meu melhor, e que fiz de coração. Claro que o dinheiro no fim do mês também me dá jeito e também trabalho por ele, mas também gosto muito de fazer o que faço!
Perguntavam-me num destes dias, porque digo que gosto do meu trabalho se é monótono (na minha opinião, poucas coisas são monótonas), se trabalho aos fins semana e feriados, se, se, se...
Ora então, talvez o segredo esteja no part-time, e isso permite-me que o tempo que estou a trabalhar, dê toda a minha disponibilidade, energia e atenção! Metade do tempo dedico-me ao trabalho, outra metade à família (estive mais presente em todas as fases de crescimento do meu filho), a outras actividades (no meu caso voluntariado) e até a descansar, porque tendo fibromialgia, por vezes, é preciso fazer uma pausa! Consigo gerir bem o meu dia, mesmo que trabalhe num domingo, nunca é o dia todo, por isso não me queixo, é tudo tranquilo!
Felizmente os clientes percebem que não estou ali contrariada, mesmo que seja domingo de Páscoa! É bom saber que é essa minha disponibilidade que passo aos outros!
Claro que ganho menos que um full-time, e o dinheiro tem que ser melhor gerido, mas tem outras contrapartidas. Felizmente posso ter este pequeno luxo!
Estou neste trabalho há quase 20 anos. Faço-o com todo o gosto e até amor, e, se me deixassem ficaria aqui mais outros 20 anos, com o mesmo entusiasmo, porque este trabalho sempre foi terapêutico e nunca para aqui vim como se fosse um frete, nunca!
Podem perguntar "mas não queres subir de posto, evoluir?" Ao que eu respondo "mas eu sou tão feliz assim, tantas pessoas que passam anos a querer ganhar mais , a querer subir! Eu já tenho o que quero! É assim tão mau me deixar ficar por aqui!?"
Eu sei e fico contente com isso, que alguns clientes me escolhem pela conversa, pelo apoio que sempre tento dar. Alguns clientes contam-me situações da vida deles, e eu tento sempre ter uma palavra de conforto. É essa a parte que mais gosto, faço um pouco de psicologia ou sociologia. Sei que de certa forma os ajudo.
Pois é, 15 anos! Sou operadora de caixa, neste local, vai fazer 19 anos, e tenho o blogue há 15!
O tempo vai passando, e vai sempre havendo novas historias, situações, cenários. É certo que o blogue já esteve mais activo, mas também é certo que, mesmo assim, está atualizado!
Apesar de ter também pagina no Facebook, ou no Instagram, e até canal no youtube, foi no SAPOBlogs que ele nasceu, e será sempre aqui a minha primeira "casa"! Quando me perguntam se me considero uma influencer, a minha resposta é "acho que não", pois eu não divulgo marcas ou produtos, eu apenas, conto histórias, que são verdadeiras, inusitadas, caricatas, engraçadas, outras sérias!
Quero agradecer a todos vós que por cá passam, que comentam, que são compreensivos.
Sempre que tiver cenas para vos contar, e sempre que achar que este blogue pode ser útil, estarei por aqui. E no supermercado terei sempre a minha lupa ao lado!
Muito grata a todos os que se têm colocado debaixo da minha lupa!
Nos primeiros tempos da minha vida e até aos meus 20 anos de idade, sonhei ser professora de primeiro ciclo. Em miúda, sempre que iam crianças à minha casa, incluindo os meus primos mais novos, eu dava papel e lápis e punha-os a escrever. Mas tudo não passou de um sonho, que não foi possível concretizar!
Entretanto, com esta profissão de contacto com o público, e quando surgiram os livros, algumas pessoas me aconselharam a fazer uma formação em sociologia, porque tinha jeito.
No meu imaginário, eu vou para a universidade, que foi algo que sempre quis, faço sociologia, mas volto para o supermercado, crio uma caixa especial, " a caixa da socióloga", uma caixa , onde não há pressa, onde atendo quem tenha tenha vontade de conversar um pouco. Uma caixa mais lenta, mais virada para a humanidade, para os mais velhos, para quem tiver tempo, e juntava esta minha capacidade, ou dom, com estudo e formação!
Não é só o gosto e o amor à profissão de operadora de caixa, de que faz parte o público, o atendimento ao mesmo, a boa relação com os clientes. Também há outras coisas, tais como: o facto de ter bons colegas, o espaço interno do colaborador ser muito fixe.
Temos a mesa da partilha, cafezinho gratuito, entre outras coisas mais.
É certo e sabido que este blogue, é um espaço onde partilho as experiências vividas com os clientes que passam pela minha caixa.
Mas, desta vez, gostaria de partilhar uma reflexão em relação aos colegas de trabalho, refiro colegas, neste caso a todos, sem olhar à hierarquia.
Sou muito agradecida pelos colegas que tenho. Dou-me bem com todos, embora possa ter mais afinidade com uns do que com outros, mas só tenho a dizer: são todos boa gente! Nunca tive um grande atrito com um colega, e já são cerca de 17 anos. Também existe o facto de ter um trabalho mais individual, mas ainda assim, dou-me bem com colegas que não são da minha seção. Posso até dizer que tenho ali, amigas de verdade.
Sempre que é possível, há conversas, brincadeiras, trocas de ideias. Mesmo em momentos mais difíceis, sempre tive apoio.
Tenho colegas que me tratam por um diminutivo que me transporta para a infância e para os bons momentos com os primos da minha aldeia.
Aquele habitual e simpático "bom dia"!
Além de tudo isto, ainda tenho aquelas colegas prendadas que fazem coisinhas doces que me dão ou que me levam frutas, tais como nêsperas, marmelos, romãs.
Portanto ir trabalhar, não é um frete, é um gosto! Claro que nem tudo é um mar de rosas, lá aparece um espinho ou outro, mas em relação aos clientes, não em relação aos colegas!
Sou muito abençoada e grata. Também acho que sou uma pessoa de trato fácil!
Obrigada a todos os/as colegas! Gosto muito de vocês!
Preciso de clarificar aqui uma situação, devido a um comentário que recebi.
Mesmo que por vezes aparente que são tantas as situações negativas que acontecem que parece que a qualquer altura vou cair, não é bem assim! Ao fim de tantos anos nisto, já estou vacinada . Apenas fico sentida no momento, mas depois venho para casa, se tiver, tempo e vontade ainda partilho as ocorrências. Contudo, no dia seguinte já estou fresca e pronta para outra! É tipo uma fénix, que renasce das cinzas.
Se partilho as situações não é só para meu desabafo, mas também para que sirva de lição e exemplo a que me lê, ou para quem passa pelo mesmo! Isto porque agora tenho umas quantas colegas que me lêem na página do Facebook, e é tão bom!
Por isso eu não preciso de ficar na retaguarda, porque, como disse alguém, aquilo que não nos mata, fortalece-nos!
Por vezes há clientes que partilham comigo, situações pessoas, vivências, preocupações. Talvez me escolham, porque eu não sou dali, não tenho ali raízes, nem conheço o passado ou as histórias das pessoas e dos seus amigos e familiares. Andei durante anos a desejar ser professora primária, e deveria era ter desejado ser psicóloga ou socióloga, já que uma está relacionada com o meio onde vive e convive e a outra se refere a cada individuo na sua singularidade.
Histórias de maridos que controlam as contas das esposas, historias de separações conflituosas, de doenças, situações tristes, de solidão, de perdas dramáticas...
Um dia destes, estava pouco movimento e a cliente ficou lá um bom bocado a conversar, só pensei "esta vida dava um livro"!
Nós operadoras de caixa, acabamos por ser um pouco psicólogas, mas por vezes, perante a gravidade da situação que me contam, sinto que me falta aquela palavra certa para dar à pessoa, quem diz palavra diz conselho, mas pelo menos, julgo que sou boa ouvinte, e que consigo transmitir algum conforto.
Por vezes quem vê caras, não vê corações, é um cliché, mas adequa-se, porque só conhecendo a história de vida da pessoa conseguimos entender melhor as suas atitudes!
Daí que quando alguém tem uma atitude menos comum, já penso que alguma razão ela terá, para agir assim...